AGB-PoA e AGP/RS assinam Documento contra Parecer Técnico da EPTC (Porto Alegre)

03/09/2020 18:48

A Associação de Geógrafos Brasileiros - Seção Porto Alegre (AGB-PoA) e a Associação dos Geógrafos Profissionais do Rio Grande do Sul (AGP-RS), entidades representativas de geógrafos e geógrafas, e professores e professoras de geografia, manifestam através deste documento indicar possíveis inconsistências presentes no PARECER TÉCNICO PROCESSO SEI 20.0.000044313-2 emitido pela Empresa Pública de Transporte e Circulação, assinado pelo Arquiteto e Urbanista Régulo Franquine Ferrari, Técnico em Trânsito e Transporte - Matrícula EPTC 925.3 - a pedido da UTAF – Unidade Técnica de Apoio Funcional da SMED – Secretaria Municipal de Educação, como justificativa para a Prefeitura Municipal de Porto Alegre, através de publicação no Diário Oficial de Porto Alegre do dia 03/08/2020, retirar a localização caracterizada como “Difícil Acesso” de inúmeras escolas da rede municipal.

 

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A Associação de Geógrafos Brasileiros - Seção Porto Alegre (AGB-PoA) e a Associação dos Geógrafos Profissionais do Rio Grande do Sul (AGP-RS), entidades representativas de geógrafos e geógrafas, e professores e professoras de geografia, manifestam através deste documento indicar possíveis inconsistências presentes no PARECER TÉCNICO PROCESSO SEI 20.0.000044313-2 emitido pela Empresa Pública de Transporte e Circulação, assinado pelo Arquiteto e Urbanista Régulo Franquine Ferrari, Técnico em Trânsito e Transporte - Matrícula EPTC 925.3 - a pedido da UTAF – Unidade Técnica de Apoio Funcional da SMED – Secretaria Municipal de Educação, como justificativa para a Prefeitura Municipal de Porto Alegre, através de publicação no Diário Oficial de Porto Alegre do dia 03/08/2020, retirar a localização caracterizada como “Difícil Acesso” de inúmeras escolas da rede municipal.

As possíveis inconsistências apresentadas suscitam questionamentos ao referido parecer técnico, o que justifica esta manifestação das associações. Neste sentido, indicamos:

Quanto ao que está descrito na página 02

"CONSIDERAÇÕES O Decreto 9914 prevê condições objetivas, vinculadas ao transporte coletivo disponível a partir do Centro Histórico e das condições do percurso de caminhada até as paradas de ônibus. A redação, porém, dá margem a alguns questionamentos e interpretações sobre os quais apresentamos as considerações a seguir, visando esclarecer como foi avaliada cada condição na análise. Para definir quais as linhas de ônibus que atendem cada unidade de ensino, foi considerada a distância máxima de 500 metros de caminhada do portão da escola até as paradas de ônibus que atendem a região. Essa distância máxima de 500 metros é o padrão de acessibilidade à rede de transporte coletivo tomada como parâmetro na definição do percurso das linhas e na alocação de pontos de embarque e desembarque de ônibus." (p.02)

➢ 1º Aponta-se que os critérios levaram em consideração condições objetivas, que, no entanto, dão margem a “questionamentos e interpretações". Isso caracteriza que os critérios apresentados no documento não são incontestáveis, tampouco eminentemente objetivos, já que foram baseados em interpretações do texto do decreto.

➢ 2º Também a escrita

“Para definir quais as linhas de ônibus que atendem cada unidade de ensino, foi considerada a distância máxima de 500 metros de caminhada do portão da escola até as paradas de ônibus que atendem a região”. Isso porque o Decreto 9914 a partir do art. 34 da Lei. 6151/1988 afirma ser no item III "percurso igual ou superior a 300 (trezentos) metros". Portanto, destaca-se a palavra anterior "IGUAL", da qual se conclui que juridicamente o mínimo de 300m da escola até a parada de ônibus que atende a região é a distância legitimada. Quando ao escrito na página 03 do parecer em que há a afirmação “Foi considerada a distância do portão da escola, de acordo com o endereço fornecido, até a parada de ônibus mais próxima. Diante da impossibilidade de realizar vistorias em todas as escolas, a distância foi verificada através do aplicativo Google Earth, que possui precisão adequada.” (P.03)

● 1º O Google Earth não possui precisão exata, entre outras funções, para o fim utilizado no parecer, como medições de distância. Há referências científicas[1] que questionam a precisão deste aplicativo

Por ser uma ferramenta de geoprocessamento gratuita e de fácil uso, ela alcança diferentes públicos, desde o cidadão simples até usuários acostumados ao uso de sistemas de informações geográficas. Esse conjunto de fatores torna suas imagens bastante disseminadas, porém o que os usuários desconhecem os seus limites de precisão, pois eles não percebem que por detrás da “nitidez da imagem” podem estar ocultos erros que estão sendo desprezados, podendo trazer sérias consequências nas decisões apoiadas sobre estas bases. A ausência de dados precisos implica no fornecimento de informações não confiáveis, que consequentemente irão gerar erros comprometedores à qualidade dos estudos. (SILVA et Al., 2013. p.01) [grifo nosso].

Conforme o artigo científico e suas considerações deve-se observar a época da captação das imagens e dados, assim, como a qualidade da imagem de satélite quanto à resolução para precisão das medições.

● 2º Ainda segundo as Instruções Reguladoras das Normas técnicas da Cartografia Nacional decreto n: 89817 de 20 de jun de 1984 Cap II seção 1 e 2, que refere-se “a exatidão e classificação de uma carta de classe superior a 90% dos pontos bem definidos e testados, não deverão apresentar erro superior ao Padrão de Exatidão Cartográfica - Planimétrico”. Entretanto, as bases da empresa Google não se tem essa precisão e estudos salientam que a há pontos de divergência quanto a posição dos pontos de coleta.

● 3º Ressaltamos que há uma base cartográfica oficial, logo, legitimada para o município. Esta entra em vigor a partir do DECRETO Nº 18.315, DE 11 DE JUNHO DE 2013 e no seu Art.2º destaca:

Art. 2º Os trabalhos de delimitação e demarcação de terras, de topografia e cartografia solicitados, realizados ou contratados por Órgãos do Executivo no âmbito da Administração Centralizada e Descentralizada da PMPA, bem como anteprojetos, projetos e quaisquer outros levantamentos relacionados a essas atividades, que dependam de exame, aprovação ou controle desses Órgãos, deverão estar referenciados ao SCR-POA e à RRCM, conforme definido no art. 1º deste Decreto.

Portanto, contestamos o parecer quando pretende a partir desta ferramenta Google Earth para justificar medições topográficas, já que o art.34 da Lei Lei 6151/1988 consta no ítem III

III - percurso igual ou superior a 300 (trezentos) metros, a ser cumprido a pé, em terreno acidentado, sem calçamento ou calçado em parte, entre a parada mais próxima do transporte coletivo regular e a unidade escolar;

Ainda é necessário atentar-se à taxonomia “terreno acidentado” que conforme Dicionário Geológico Geomorfológico (GUERRA, 1966) refere-se à

“ACIDENTE DO RELEVO - denominação usada para qualquer forma de relêvo que ofereça contrastes com outras que lhe estão próximas. Quando os desnivelamentos são fortes. e constantes, costuma-se denominar a paisagem assim descrita de: região acidentada, relêvo acidentado, ou terreno acidentado, etc..” (GUERRA, p. 08, 1966)[2]

Já o Manual Técnico do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística- IBGE3 (2009) refere-se à taxonomia “Serra” como inserida em um “terreno acidentado”

“As serras constituem relevos acidentados, elaborados em rochas diversas, formando cristas e cumeadas ou as bordas escarpadas de planaltos.” (IBGE, 2009. p. 30).

Ressalta-se que para caracterizar áreas de difícil acesso seja necessário considerar o termo “terreno acidentado” dentro do contexto taxonômico geológicogeomorfológico a que se refere e assim, avaliar estas áreas quanto a sua topografia com acurácia através de medições com instrumentos cientificamente comprovados como adequados para este fim.

Retornando a página 2 no que se refere ao primeiro critério:

"transporte coletivo regular de uma única linha de ônibus, cujo percurso do terminal-centro até a escola seja, no mínimo, de 16 (dezesseis) quilômetros" (p. 02).

Questionamos o que é o "regular" a partir dos problemas existentes de mobilidade urbana na capital. As vias são acidentadas e há congestionamentos que influenciam na regularidade das linhas, tanto em horários quando em viagens com outros transtornos (superlotação e frotas com constantes defeitos mecânicos). Muitos profissionais da rede de ensino utilizam outros ônibus no deslocamento até o percurso da linha principal que faz o trecho centro-escola

Nesse momento, estamos com tabelas de horários diferentes em função da pandemia de COVID-19 o que impossibilita a real mensuração de tempo de deslocamento e tempo de chegada à escola em tempo hábil para o início dos turnos da escola. Como há previsões de retorno ainda esse ano das aulas presenciais, não há garantias ainda de volta dos antigos horários que, mesmo assim, já apresentavam os problemas aqui mencionados.

Outro ponto importante que necessita de esclarecimentos e estudo realizado com maior precisão e cuidado é o ocultamento no parecer da verificação de horários de ônibus para atender os professores que trabalham no turno noite. Há escola que tiveram o direito negado e estão localizadas em bairros de alta periculosidade, onde motoristas de aplicativos não atendem a região bem como lotações.

A tabela de horários, divulgada pela Empresa Pública de Transporte e Circulação (EPTC), também, constantemente, é desrespeitada. Dessa forma, os frequentes atrasos, as decorrentes superlotações e estragos na frota já obsoleta, colocam em risco o compromisso que temos com o cumprimento de horários. Há relatos de professores da rede que precisam organizar-se em sistemas de caronas com colegas e/ou familiares.

Esses aspetos socioespaciais deixam evidentes o difícil acesso às escolas da rede, principalmente as que perdem o direito e estão localizadas em áreas periferizadas.

Diante disso, com base no disposto no PARECER TÉCNICO PROCESSO SEI 20.0.000044313-2, questionamos, a partir de argumentos técnicos e científicos, o referido parecer. Apontamos que os dados técnicos utilizados para sua elaboração interferem de forma equivocada na realidade socioespacial da localização das escolas, o que afeta diretamente naqueles que atuam nas zonas mais vulneráveis da Cidade.

 

Associação de Geógrafos Brasileiros – Seção Porto Alegre

Associação de Geógrafos Profissionais do Rio Grande do Sul

Porto Alegre, 28 de Agosto de 2020

 

[1] SILVA, Ellienay Simony Gomes Soares da; AMARAL, Marcelo Henrique Pontes do ; MONTEIRO, Tallyta Tâmara da Silva . COELHO Jr, José Machado. EXATIDÃO CARTOGRÁFICA DE IMAGENS DO GOOGLE EARTH EM DOIS IRMÃOS, RECIFE - PE. XIII JORNADA DE ENSINO, PESQUISA E EXTENSÃO – JEPEX 2013 – UFRPE: Recife. Disponível em https://www.eventosufrpe.com.br/2013/cd/resumos/R1719-1.pdf

[2] GUERRA, Antônio Teixeira. Dicionário Geológico-geomorfológico.2ª edição. INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATíSTICA. CONSELHO NACIONAL DE GEOGRAFIA. Série A. Biblioteca Geográfica Brasileira. Publicação N ° 21 Rio de Janeiro, 1966 3 Manual técnico de geomorfologia / IBGE, Coordenação de Recursos Naturais e Estudos Ambientais. – 2. ed. - Rio de Janeiro : IBGE, 2009. 182 p.

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